terça-feira, setembro 01, 2009

Crise de valores ou de identidade

Durante a fase de preparação para o exame de acesso +23 ao Ensino Superior desenvolvi vários textos sobre valores, sociedade, cultura, globalização e mass media e que, por me parecerem interessantes, e assim terem sido valorados, os partilho aqui. Foi uma fase de estudo e reflexão que passei durante largas semanas e este foi o resultado. No mundo actual existe uma enorme diversidade de culturas desde as mais avançadas, tendo em consideração que cultura abarca sociedade, nível de avanço tecnológico e bem-estar social, como nos países nórdicos e os anglófonos, passando pelos países moderadamente avançados como os da periferia europeia até aos países menos desenvolvidos ou os mesmos atrasados em termos de desenvolvimento como alguns países do continente Africano. Esta enorme diversidade de culturas ou sociedades manifesta-se igualmente nas características dos seus povos e nos seus usos e costumes dando imagem própria de cada um mas no essencial estes diversos tipos de sociedade dão, julgo eu porque nunca tive contacto directo com elas, também uma imagem das características humanas dos seus povos através de traços e pormenores próprios: abertura e descontracção nas sociedades mais avançadas, tendências fechadas, possessivas e subjugação dos elementos familiares diversos em relação ao chefe de família, nas sociedades mais atrasadas. Apesar, obviamente, destas disparidades, todas estas culturas e sociedades devem ser respeitadas nas suas especificidades e a condição humana dos seus cidadãos deve ser defendida. Aliás, este sentimento de respeitabilidade das sociedades e culturas mais atrasadas assim como da condição humana dos seus cidadãos é, em norma, mais e melhor entendida nas sociedades ditas avançadas ou médias do que nas próprias sociedades atrasadas. Os exemplos são infelizmente inúmeros mas refiro apenas dois: - os gastos com o aniversários do presidente Mugabe em comparação com o estado de subnutrição dos presos de pequeno delito nas pensões do Zimbawbe (notícias na TV em 3/4/2009, no noticiário das 20h00). Chocante. - a exploração selvagem a que as crianças dp Congo são sujeitas para extraírem o minério usado no fabrico de equipamentos electrónicos actuais, fazendo do Congo o principal país exportador deste bem precioso e, consequentemente, daí tirando enormes dividendos à custa dos mineiros escravos. No campo da respeitabilidade das características e especificidades próprias de cada cultura ou povo, não se deve esquecer, contudo, que esse respeito não deve permitir que tudo se faça ao abrigo da defesa dos usos e costumes de cada povo. Por exemplo, não se deverá permitir a um árabe que maltrate uma mulher ocidental porque ela anda na rua com a cara destapada Vivemos num mundo que, contrariamente à sua forma redonda, é muito heterogéneo quanto a condições de vida e de oportunidades dos diferentes povos que o habitam, Os continentes da América do Sul, África e o Sudoeste Asiático parecem ser as áreas do planeta onde as dificuldades são maiores e as desigualdades também, É, também, nessas áreas do globo que vivem ou tentam sobreviver a maior parte dos habitantes do planeta. Em termos gerais ¾ da população mundial não tem acesso ao conhecimento básico, como o saber ler e escrever, e isso contribui em muito para o seu atraso no desenvolvimento social e nas suas condições de vida. Em face destas realidades que são a pobreza e a falta de cultura, as questões morais oi de carácter tendem a ser secundarizadas e, desse modo, os valores a serem esquecidos. Não há condições para questões morais ou culturais quando a batalha mais premente é a da sobrevivência. Nas sociedades mais avançadas e nas organizações de apoio humanitário tenta-se consciencializar os responsáveis a não deixar diluir os valores e as características próprias destes povos ancestrais que são riquíssimos em tradições. Tenta-se simultaneamente alimentar o corpo e dar-lhes condições para que o espírito das novas gerações seja também alimentado para que as culturas e tradições de povos com milhares de anos, como os descendentes dos Incas, dos Maias e, visto recentemente na TV (televisão), dos Irahucas no Peru, poderem retomar os seus hábitos e tradições culturais. É um desafio da humanidade actual, o atenuar das desigualdades entre os que têm tudo e, quiçá, são pobres de espírito, e os que pouco ou nada têm mas são, em grande parte, herdeiros de riquíssimas culturas. Nas sociedades actuais onde o advento da transmissão de conhecimentos e de informação é, cada vez mais, instantâneo, assiste-se à tendência para se considerar a educação como um processo que decorre ao longo da vida devido ao desenvolvimento das sociedades de informação e de conhecimento. Esta nova abordagem da educação e do conhecimento é muito importante porque permitirá o aparecimento de novas gerações mais cultas e preparadas para os novos ritmos da sociedade. O sonho ou projecto de existir uma aprendizagem ao longo de toda a vida para todos tem a ver com a intenção de que seja possível disponibilizar um modelo de educação avançado e completo, para todos as pessoas dos países e sociedades menos desenvolvidas. No campo dos valores, com o avanço das sociedades em direcção à sociedade de conhecimento de novos valores ou conjunto de valores que tendem a descaracterizar as culturas mais antigas e a “uniformizá-las” com outras culturas e povos distantes. Será normal ver-se, nos dias de hoje, um japonês e um americano ou um francês e, porque não dizê-lo, um português apreender os mesmos tiques e vícios das comunicações “sms” (short message system), com o telemóvel, quiçá da mesma marca e modelo. Por fim, em relação aos valores assiste-se ao efeito de criação e reinvenção de novos valores e necessidades para as sociedades actuais em detrimento da manutenção e defesa dos valores antigos. Por exemplo, assiste-se nas famílias actuais ao cada vez menor hábito de se tomarem as refeições em conjunto enquanto se fala e convive em família para, em oposição, se assistir a conviver com a televisão e com os “messengers” electrónicos (programas de computador que permitem diálogos interactivos, escritos, através da internet) para se comunicar com os amigos. Não é pouco frequente ouvir-se dois jovens acabarem uma conversa presencial, dizendo: “depois falamos na net!”. Outro efeito das sociedades de comunicação instantânea a que assistimos nos tempos actuais é ao esforço das gerações mais antigas em transmitir valores e conhecimentos aos mais novos e verificar-se que a receptividade e aprendizagem destes últimos é inferior ao que foi transmitido, perdendo-se assim, gradualmente, algo de valores e conhecimentos na transmissão entre gerações. A humanidade actual tem um enorme desafio a enfrentar, para além da subsistência, que é o da preservação dos seus valores morais e riqueza culturais, especialmente a dos povos em maiores dificuldades. O desafio que se coloca é o de fazer face à erosão da diversidade de línguas e culturas. Para além dos povos referidos no texto anterior, não nos podemos esquecer dos povos da América do Norte, os tradicionais Índios que foram popularizados pelos filmes de “cowboys” mas que, na realidade, ou porque foram aglutinados ou porque foram maltratados, já quase não existem como povos ou sociedades com cultura própria. Mas nem só dos povos antigos e culturas tradicionais as preocupações da humanidade se devem ocupar: não nos esqueçamos das pequenas comunidades, normalmente de regiões específicas e mais afastadas dos grandes centros. Estas comunidades detêm traços culturais e, em alguns casos, linguísticos, muito próprios que devem também ser preservados a par das ajudas para a sua subsistência. Apenas um exemplo em Portugal: as comunidades em redor de Mirandela e o seu dialecto local, o “mirandês”. Em resumo, é necessário cuidar dos valores culturais dos povos em maior dificuldade e com um PIB (Produto interno bruto) mais baixo, de modo a preservar a grande riqueza e variedade de culturas que a humanidade ainda detém. Perante todas as considerações anteriores, poderemos estar, e em certa medida estamos, perante o risco da perda de valores. Mas, com a rápida evolução da Sociedade do Conhecimento e com a rápida disseminação da informação “online”, que permite que as réplicas do recente terramoto na cidade Italiana, Átila, sejam seguidas em directo na televisão, também devemos encarar a realidade de que os valores se vão transformando ou mudando e que novos valores vão aparecendo. Assim, um grande desafio é o da escolha de valores em face à grande diversidade de situações novas que ocorrem nas sociedades. Por exemplo, será um valor a preservar a nova maneira de contacto, a linguagem tipo “sms” tão vulgar entre a juventude actual? Por outro lado será positivo as pessoas estarem cada vez mais a isolar-se e a perder o hábito do convívio pessoal da conversa oral em detrimento da conversa, dita digital? É esta escolha de valores emergentes que deve ser feita pela sociedade actual, especialmente as mais avançadas em termos de informação e comunicação. Para este efeito a troca de conhecimentos é importante para a preservação dos valores e características dos povos e comunidades mais pequenas e sujeitas a influências externas. Os meios de registos actualmente disponíveis como por exemplo os registos audiovisuais e registos informáticos podem ser um precioso auxiliar na preservação desses valores morais e culturais e sua difusão e divulgação através dos mass media (meios de comunicação de massa). Os mass media ou os meios de comunicação de massa são assim designados porque se destinam a uma vasto número de receptores das mensagens ou comunicação que veiculam. Em oposição à comunicação individual ou directa que está presente ao diálogo directo ou por intermédio do telefone, os mass media têm um emissor, normalmente uma equipa de profissionais, e muitos receptores que podem chegar aos milhões. Os mass media mais conhecidos são: a rádio, a televisão, os jornais e revistas e os livros. Ultimamente, nas duas últimas décadas, apareceu um novo veículo de comunicação que incorpora algumas das características dos anteriores meios de comunicação de massa, a internet. Os métodos de difusão da informação são, na generalidade, a escrita nos jornais revistas e livros, a voz na rádio e a imagem e voz na televisão. A informação difundida pelos mass media pode ter duas grandes divisões: a notícia, mera informação, e a cultura se for desenvolvida e aprofundada quanto ao tema. Os mass media, além do papel importante que têm na difusão da informação e cultura, podem também ter outros papéis como o entretenimento e a influência sobre o público a que se destinam. Essa influência pode ser de carácter positivo, como por exemplo, educar as pessoas para correctos hábitos de cidadania ou pode ser de alienação das consciências colectivas levando o público a viver realidades que não são as suas e, assim, a esquecerem-se dos seus reais problemas ou a serem levados a consumir produtos de que realmente não precisam. Os mass media, porque dependem de audiências para sobreviverem tendem a canalizar a atenção dos seus públicos para os “produtos” que lhes dão mais rentabilidade. Assim, sendo um mal necessário e indispensável na sociedade actual, devem ser regulados e vigiados por entidades competentes para tal: os diversos Provedores dos consumidores. Os mass media são um dos principais facilitadores da globalização. A globalização caracteriza-se pela partilha, entre todos ou a maior parte dos países, do conhecimento, mercados, culturas, língua, informação, medos, preconceitos, paixões, etc… e, assim, a globalização, quanto à transmissão e difusão de valores, funciona ao mesmo tempo como um elemento facilitador (porque ajuda) da difusão e um elemento transmissor de influências externas que “contaminam” os valores locais. A pluralidade de valores e culturas representa o grande número que existe de povos, regiões e respectivas especificidades próprias a que se chama de “cultura” e derivando dos hábitos, costumes e crenças dos povos, resultam ou desenvolvem-se os chamados valores morais ou éticos de cada povo ou população com laços próprios. A crise de valores que se apregoa tem a ver com o efeito que a globalização provoca na difusão, disseminação e proliferação de valores provocando a que a sua mistura e dificultando a correcta identificação, por parte do indivíduo, dos valores que deve assumir e manter como seus. Esta crise de valores, acaba por se concretizar numa crise de identidade dos valores de cada um e um “aplanar” desses mesmos valores. Resultando dessa dificuldade de identificação dos valores e da sua manutenção, acaba por se assistir ao aparecimento da co-habitação de valores que poderão ser considerados contraditórios entre si e, assim, contribuir para a tal crise de valores que é, conclui-se, uma crise de identidade de valores.